Por Welton Trindade
Dona de, possivelmente, a cena drag queen mais fervorosa do Brasil, Salvador merecia ter uma peça tal como Uma Janela para Elas, com roteiro de Felipe Politano e direção de Paula Lice.
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Se apenas tentasse dar conta da movimentação drag e transformista soteropolitana e da situação política do país que tanto ameaça tirar o Brasil dos altos postos de respeito à cidadania LGBT no mundo, a obra já teria valor.
Como ela faz isso de forma esperta, sem pedantismos e em meio a risos, Uma Janela para Elas torna-se grande presente a LGBT da capital baiana. Uma coroação feita sob holofotes.
Ia 2018 quando um governo conservador toma conta do poder no Brasil. LGBT são cerceados. Acaba-se a liberdade de ser quem se é. E, aí, a arte transformista (viu mulheres? Trans-for-mis-ta) também.
Eis que seis drag queens de Salvador, inclusive uma exilada em Marte e outra dona de Cajazeiras, por exemplo, recebem chamado misterioso. A opressão precisa terminar. Elas precisam agir... Como? Brilhando nos palcos, querida!
É dada aí a largada para que Ah Teodoro, Angelina Meels, Flaminga, Milla Hunty, Minx Moon e Sasha Heels, sob comando da quase Mestre dos Magos Valerie O'rarah decidam-se se vão encarar ou não a grande missão.
Confinadas em lugar por onde se entra pela janela, o sexteto troca relatos de como o Brasil tornou-se uma ditadura moralista, revela que Pablo Vittar teve de sair do País, lembra suas carreiras, e nos mostra que o que está ruim (na opinião do autor) pode piorar.
Tudo um pouco sombrio? Que nada! O texto de Politano é hilário, sabe misturar referências do meio LGBT de Salvador com o universo mais particular das drag queens, faz gargalhar com tiradas a respeito do mundo pop e as divas gays ao mesmo tempo que gera identificação do público local por peculiaridades da capital, essa coalhada de Drogasil!
As tiradas a respeito dos infinitos concursos de drags em Salvador são espirituosas.
Somada a isso a movimentação de cena eficiente dada pela diretora e a competência das artistas em agora interpretar por palavras emitidas, Uma Janela torna-se gostosa uma hora de imperdível metalinguagem drag queenzística (?).
Ganha a arte drag, ganha a cena gay da cidade por ter esse espelho tão engraçado e politizado, perde quem não for ver.