Por Marcio Claesen
Poucos personagens do cinema podem ser considerados um muso gay na mesma proporção que Tadzio, o jovem objeto de desejo de Morte em Veneza (1971).
E é sobre seu intérprete, Björn Andrésen, que se debruça O Garoto Mais Bonito do Mundo, destaque na 45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
No documentário de Kristian Petri e Kristina Lindström somos praticamente coagidos a investigar cada marca de expressão no rosto de Andrésen e procurar o viço e a perfeição que encantaram o mundo 50 anos atrás.
Não são os cineastas que impõem tal tarefa ingrata, mas sim a vida ou a dificuldade que muitos de nós temos de lidar com a passagem do tempo.
E o tempo não foi camarada com o ator. A produção mostra que a vida de Andrésen, fumante inveterado, esquálido e taciturno, faz dele agora o oposto da beleza que o tornou famoso.
Para muitos, é quase como estar diante de um Retrato de Dorian Gray: afinal, Andrésen teve poucas participações no cinema e na TV de lá para cá. A sua imagem que consolidou na memória do público é aquela com 15 anos de idade.
O filme começa com a busca de Luchino Visconti por parte da Europa pelo garoto ideal que iria povoar a imaginação de Gustav von Aschenbach (Dirk Bogarde) em sua adaptação paras as telas do romance de Thomas Mann.
É na Suécia que ele encontra Andrésen, um pouco mais velho do que a média de idade que ele buscava e levado aos testes pela avó, que queria ter um neto famoso.
O menino o cativa imediatamente e o diretor sabe que sua procura incessante chegou ao fim. Desconcertado, o adolescente é induzido a ficar de cueca no teste de câmera, algo impensável em tempos atuais.
Assumidamente gay e rodeado por gays na equipe, Visconti avisa a todos, segundo Andrésen, que não se aproximem do garoto - de preferência, que evitem até olhá-lo.
Filme pronto, o "circo" de divulgação é armado e as preocupações com o jovem se diluem. Ele vai à primeira boate gay na vida e é jogado a um ritmo de entrevistas e viagens descontrolado.
Preso a um contrato de três anos, Andrésen tem sua saúde mental testada em uma temporada no Japão, onde se torna um dos primeiros ídolos ocidentais a frequentar a mídia local.
Seria preciso muita estrutura emocional e familiar para dar conta de uma fama repentina e mundial como essa. Mas ele não tem.
Em Paris, passa ser bancado por homens mais velhos que o exibem como um troféu - ter o passe de Tadzio é símbolo de poder.
Sem pai e com uma história violenta em torno da mãe, Andrésen constrói sua própria família desfuncional.
Petri e Lindström o levam a viagens para esmiuçar seus fantasmas e se reconectar com partes de sua vida.
A proposta dos cineastas é difícil. Andrésen não é um tipo que cativa. Ao contrário. Ainda assim, o longa é uma experiência intrigante sobre velhice, escolhas, apoio familiar e a dificuldade de lidar com traumas do passado.
O Garoto Mais Bonito do Mundo tem sessões presenciais em São Paulo em 29/10 às 19h40 no Cine Marquise - Sala Globoplay 1 e em 31/10 às 17h45 no Cinesesc. O filme também pode ser visto em todo o Brasil de forma on-line até 3 de novembro pela Mostra Play.
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